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quinta-feira, 25 de setembro de 2008

VEJA "LAR DE MARAVILHAS - CASA DAS MÁQUINAS - EM http://peduvido.blogspot.com/

segunda-feira, 22 de setembro de 2008



Hermeto Pascoal ao Vivo
Em Montreux Jazz


Naquela noite única de 1997, quando Claude Nobs anunciou Hermeto Pascoal como sendo qualquer coisa de inacreditável, com um inesperado senso de improvisação, harmonia, composição e execução, vindo da distante e múltipla música brasileira, ele não sabia exatamente que estava fazendo parte de um momento iluminado, singular, repleto de transcendência musical e espiritual. Estavam lá no palco, junto com o mago Hermeto, todos os deuses da natureza, tocando e encantando.

Em todas as músicas do repertório daquela noite o público foi brindado com o mais alto nível de improvisação que um músico pode desenvolver. É um momento sobrenatural. A capacidade criativa de Hermeto e banda, aliás, umas das maiores bandas já formadas no Brasil e no jazz universal, é de uma grandeza incabível em palavras. A interação do mago com seus músicos e com a platéia é qualquer coisa inexplicável, são momentos de criação viva, na hora, música brotando no suor.

Hermeto tocou tudo que se possa imaginar: piano, clavinete, sax soprano, sax tenor, clavieta (escaleta), flauta, e improvisação de voz. Em todos esses instrumentos ele quebrou tudo, o seu improviso de escaleta em “Lagoa da canoa” é fantástico, ultramoderno, cheio de swing, harmônicos, vozes de embocaduras e escalas nada diatônicas, em um instrumento extremamente limitado. Essa mesma faixa começa com um solo de bateria de Nenê,que não tem explicação plausível. Essa obra-prima ainda tem um solo de tenor de Cacau que é de outro mundo. Nivaldo Ornelas dá uma aula, nessa mesma música, de ritmos e pegadas brasileiras em um sax soprano, através de saltos de notas e intervalos inacreditáveis. A faixa termina em apoteose.

Esse é apenas um dos momentos mágicos desse show. A faixa “Remelexo” é uma improvisação de voz de Hermeto Pascoal, em que ele transcende e faz da voz um instrumento de improvisação, com escalas e letra ao mesmo tempo. A banda não conta conversa e entra na onda.O chorinho “Fátima”, vira o maior jazz, com uma improvisação de Hermeto Pascoal na escaleta, o instrumento que ele está tocando na capa do disco, em cima de uma harmonia mais do que complexa. Ele não só reinventa esse instrumento como reinventa as possibilidades de improvisação em uma seqüência harmônica de desempregar muitos músicos.

Em “Terra verde”, “Maturi” e “Quebrando tudo”, Hermeto avessa o clavinete, que é outro instrumento muito limitado, que nas mãos do bruxo ele ganha cinqüenta mil oitavas. Hermeto Pascoal nessas músicas, que são emendadas pelos improvisos, faz citações de outras e encontra atalhos atonais descomunais, além de descobrir timbres jamais escutados nesse instrumento, em um desafio de solfejo e teclas histórico, com a banda esbanjando dinâmica. Aliás, que banda é essa, velho? Dá vontade de chorar de tão emocionante que é ouvir esse disco.

Nenê de bateria; Itiberê Zwarg no contra-baixo; Jovino dos Santos de harmonias impossíveis ao piano e clavinete; Zabelê e Pernambuco nas percussões diversas; e mais Nivaldo Ornelas, sax tenor e soprano; Cacau, sax tenor e soprano. Eis os ingredientes da poção mágica do bruxo Hermeto. Esse show histórico era pra terminar com a fenomenal “Forró Brasil”, uma delirante linha melódica, rápida e cheia de acidentes. Mas o público não deixou e ele voltou com a delicada faixa “Montreux”, composta no hotel, especialmente para o festival. O público ainda delirou com os improvisos “Voltando ao palco” e “E adeus” , para encerrar definitivamente aquela magia inesquecível e histórica.

Esse é um disco único.

domingo, 21 de setembro de 2008

Dos rituais

As catapultas se coçam
Com as pulgas prostitutas
Que pugnam os desertos
No silêncio dos inquietos

As velhas linhas urbanas
Se coletivizam em divisas
Além da constante de Planck
No silêncio dos inquietos

Esse trem metropolitano
Que segue rasgando o finito
Babando sobre os trilhos
É cheio de almas ruidosas

Esse escrito circunscrito
Que corta as unhas e vai ao
Supermercado todo mês
É cheio de almas ruidosas

Assim as andorinhas procriam
As telas eletrônicas entram no cio
Os oxímoros se oxidam e as
Velhas virgens trocam de sexo

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Das Tensões

Ainda estão lá
Aquelas três moedas surradas
Em cima do balcão velho

Eram para comprar o universo
Mas o espaço é curvo
Cheio de esquinas iluminadas
Por lâmpadas fubazentas

Ainda tristes
Os cotovelos arredaram
Sobraram as cotovias embriagadas
Descendo a rua de pedra lavada

A saudade é essa imensidão
Encurtada pelas palavras
Que também não pode
Ser comprada

terça-feira, 9 de setembro de 2008

Tem novas postagens no blog http://peduvido.blogspot.com/ confira!
Dos objetos

E logo cedo
Foram distribuídas as senhas
As montanhas permaneceram ao longe
E a distância conservou-se cavalgando
No ar o cheiro de carne enlatada
Revelava os dias em campana

A inteligência prática das
Máquinas de refrigerantes e a necessidade
De transformar das esferográficas
Ufanaram afagos agoniados
Em todos os objetos sensibilizados
Pelos estranhos desejos

As carpas decoravam
Os aviões suspendiam
Os caixas condecoravam as dores
Os terminais anoiteciam o amanhã
E aquelas três crianças superavam
Povoavam o vácuo com vestígios nus

domingo, 7 de setembro de 2008

Manel de Jardim na área


Foi ontem, num show de Leninha, no novo teatro do Sesc de Juazeiro. Ele estava lá, com sua arrasadora ironia existencial, servindo como fenômeno sobrenatural para aqueles que pensam ter controle pleno dos seus domínios. Manel tocou violão, tocou baixo e fez vôos rasantes e altos, demonstrando como a magia não pode ser engarrafada e vendida como um produto capaz de transformar a sua vida. A magia de Manel é sobreviver sempre, sem desculpas e solenemente. Percebeu na segunda música que o seu violão estava desafinado, depois disso entrou definitivamente no clima David Linchiano do show e não saiu mais de lá, está eternizado em um cartaz misterioso, pregado nas paredes dos becos e avenidas do tempo.

O show teve lá suas peculiaridades que matizam ainda mais o cartel de dúvidas sobre ser o Cariri um celeiro cultural, mas o que importa é que Manel estava lá, contrariando o destino e os urubus de plantão. Sei que em todo lugar existem urubus, mas em nenhum lugar existe uma concepção existencial tão complexa desses seres como aqui no Cariri. Nós convivemos com urubus perfumados, renomados, constitucionais, religiosos, dadivosos, afetados, educadamente infames, sorrateiramente canalhas, delicadamente patifes, escandalosamente sem escrúpulos, de todas as camadas e origens, de toda estirpe empresarial e de toda sorte de opção sexual, mas sempre urubus, com suas tarjas de rapina suprema instalada em seus fígados.

Manel tem uma postura magneticamente anarquista diante da vida. Passou seis dias em coma, seu corpo sucumbiu à loucura narcotizada impostas pelas armadilhas sociais. Estranhamente fez da UTI a sua ponte de desconexão por mais de dez dias seguidos. Quando acordou, segundo ele, mais frio do que uma pedra de gelo, o médico estava passando o gel da ressonância magnética e ele ironizou: “Como é doutor, o bebê tá na posição certa?”. O médico disse que a coisa tava séria e que ele teria que tirar a sua pressão. Manel respondeu de imediato com uma pergunta: “Vai botar ela onde? A coisa ta ruim com ela, imagine sem ela”. Manel é assim, um anarquista existencial. Para ele não importa se isso é certo ou errado, sempre afirma que a vida é dele.

Mas o seu talento, Manel, é nosso, por direito, por fama e por difamação. Eu, que morro um pouco mais por dia de desilusão, senti novo ânimo em continuar convivendo com tanta alma sebosa que infesta esse velho Cariri. Mais do que nunca eu sei que devo continuar desconfiando das boas intenções do sistema, dos panos bem passadinhos, das maneiras meticulosamente ensaiadas, dos sorrisos de dentrifícios, dos diplomas conseguidos na calada da noite, e dos carrinhos mais polidos do que a autenticidade. Mas, mais do que nunca sei que a vida vai nos provê sempre uma nota bem dissonante, capaz de revelar a fraude do coro dos contentes. E você Manel, não é uma nota só dissonante, você é um acorde inteiro, ainda bem.

Saúde, meu velho, e continue metendo a mão sem medo de errar. Deixe a consciência musical para quem precisa de bengalas. Nós precisamos é de caminhos, nem que sejam fora das margens. A intuição é fora das margens. É por isso, que se retirarem os trilhos o trem não chega a seu destino. E é por isso que a mediocridade é um trem ultra moderno. Precisamos é ir. Mas ir rindo dos ridentes.