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segunda-feira, 19 de janeiro de 2009



Bone Machine – Tom Waits
O existencialismo surreal de um trovador

Alguns o rotulam como experimentalista, outros o tratam como maldito e alguns fazem referências reservadas à sua relação estreita com o bizarro e o grotesco, como se fora fruto de uma mente atormentada. Muitos dão às costas à sua estética musical, fugindo dela como os cães fogem das entidades soturnas da noite. Já outros percebem o poder das suas letras e das suas composições, que funcionam como toras de madeira que flutuam ofertadas após um naufrágio trágico. No entanto, poucos têm a devoção que eu tenho por Tom Waits e seu universo existencialista e surreal, enquanto que sagrado e profano.

Realmente não é uma experiência comum ouvir Tom Waits. Sua figura em palco também não é menos estranha. Suas letras extrapolam de todas as formas o tradicional e as receitas de flatulências fartas do mundo pop. Sua voz... Sua voz?! Bem, sua voz é simplesmente um instrumento de travessia entre as dimensões da vida e da morte. Ela é rouca, áspera, grave, soturna, contundente, misteriosa, cínica, irônica, confessional, lírica, sentimental, estratosférica e esquisitamente poderosa em seu encantamento de tudo aquilo que respira e vibra, mesmo que de vidro, de aço, de plástico, de carne, sangue e ossos.

O muro para Tom Waits pode representar uma clausura enquanto fechado em seus fetiches pós-modernistas ou uma libertação enquanto destronado pelas alternativas de convivência com o decadente e ilusório, que se tornou o mundo da alta tecnologia, com suas exclusões clássicas, suas mercadorias, seus consumos e seus acúmulos de lucros. Mas nunca representa para ele o lugar ideal para sentar a bunda e ficar apreciando a paisagem de aniquilamento, com a baba descendo pelo canto da boca. Por isso que ele é infinitamente radical. Por isso que a sua alma é habitada por subúrbios, por trilhos de metrô que se cruzam em uma malha subterrânea, por transeuntes maculados pela vida, que desafogam ou afogam suas mágoas em templos, em infernos ou em bares enfumaçados.

Tom Waits nunca gasta por conta. Sua música é minimalista em seu instrumental, mas transborda elementos em seu entrelaçamento estético. É possível escutar em suas composições traços do blues, do gospel, do rock, da música de cabaré, do jazz, da vanguarda, das trilhas de filmes e de teatro, entre outros itens mais exóticos como o tribalismo e os ruídos. Suas letras são existenciais, com traços fortes do surrealismo, além de um vasto rebotalho urbano, em que a vida, a morte, as demências, os assassinatos, as prostitutas, o amor e o esplendor vivenciados nos cantos e recantos das metrópoles são abordados com freqüência. O olhar de Tom Waits é povoado por ruas, avenidas, pontes, viadutos, carros, vitrines, prédios, terrenos baldios, lixos e mais lixos, vez ou outra parques, além do ser humano em suas mais variadas vertentes, com ou sem segredos.

“Bone Machine” é o décimo quarto disco de Tom Waits, realizado em 1992, pela Island Records. Esse é um disco referencial em sua carreira, não só pelos prêmios arrebatados e pelo deslumbramento da crítica especializada do mundo todo, mas também pela preservação da ousadia sonora e pela liberdade de criação. O disco foi gravado em uma sala de cimento cru, provedora de uma rica textura de ecos sutis, do Prairie Sun Recording studios, na California. A instrumentação, orquestração e arranjos são tão bizarros quanto às temáticas das composições, algumas já clássicas do cancioneiro alternativo internacional. A crítica alardeou as participações de Les Claypool, do Primus, e de Keith Richards, dos Stones. No entanto, elas passam apenas a fazer parte de um universo particular do autor, sem a menor chance de roubarem a cena ou qualquer coisa que o valha.

As dissonâncias permanecem, bem como um certo ar teatral das interpretações. As percussões metálicas povoam todo o disco, além de guitarras acústicas, distorcidas e com timbres inusitados, fazendo companhias a pianos e baixos acústicos encharcados de melancolia soturna. Vez ou outra aparece uma bateria pela metade. Esse é o mesmo caso de alguns sopros. A mixagem das músicas também preserva o estranhamento característico desse autor, que é um dos mais inquietos e radicais de todos os tempos. O resultado final é um dos discos mais importantes da cena contemporânea, simplesmente único. Prefiro não falar das faixas e mandá-los diretamente para a audição.

http://www.torrentreactor.net/find/tom-waits-bone-machine

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